Formando bons designers que não trabalham pra nós
- inpact5
- 29 de nov.
- 3 min de leitura

(Um desabafo profissional — mas com carinho pela nossa comunidade)
Há algo que me incomoda já há algum tempo e que, honestamente, acho que todos nós sentimos no setor: Portugal forma designers incríveis, mas a maioria não fica para trabalhar aqui. E não é por falta de escolas boas, nem por falta de talento — muito pelo contrário.
O problema é o mercado.
As escolas portuguesas estão a fazer um trabalho incrível
Quem anda neste meio sabe: em Portugal temos instituições que realmente formam designers muito bem preparados, tanto tecnicamente como criativamente.
• Escola de Moda do Porto (EMP) — sólida, tradicional, muito focada na realidade da indústria;
• UBI — ótima estrutura ligada ao têxtil, uma formação universitária muito completa;
• Universidade Lusófona (Porto) — um curso super atual, com foco em produção, sustentabilidade e processos;
• ESAD — excelente para quem quer desenvolver pensamento crítico, autonomia e domínio técnico;
• Escola de Moda de Lisboa (EML) — muito forte na formação prática e técnica;
• LSD — Lisbon School of Design — uma das escolas mais ligadas ao mercado, com uma abordagem super prática que prepara muito bem para o “mundo real”;
• Modatex — uma das principais referências nacionais na formação técnica e profissional em moda, fortíssima em modelagem, confeção, tecnologia têxtil e ligação direta à indústria.
Ou seja: não estamos a falhar na formação. Estamos a falhar no “depois”.
O que afasta estes designers? Salários e falta de oportunidades
E aqui acho que todos já sabemos mais ou menos o que vou dizer, mas vale pôr preto no branco.
O salário médio de um designer de moda em Portugal anda por volta de 1.170 €/mês.
Muitos começam com 690 €/mês.
E mesmo quem progride raramente passa da faixa dos 886 € a 1.869 € em muitos cargos.
Além disso, o mercado é pequeno. Poucas marcas têm equipa de design interna, poucas investem em desenvolvimento próprio, e a maior parte do setor vive muito de produção para terceiros.
Resultado?
Formamos talentos e enviamos eles diretamente para Londres, Paris, Barcelona, Milão, Berlim, Amsterdam…
onde conseguem ganhar mais, crescer mais e ter acesso a um mercado criativo muito mais estruturado.
E quem fica cá?
Quase sempre aqueles que, por algum motivo pessoal, não podem sair.
Não aqueles que escolhem — mas aqueles que precisam ficar.
Porque isto devia preocupar (e unir) todos nós
Esta saída constante de talento toca em várias áreas:
• Perdemos inovação interna — designers são o motor da diferenciação;
• Continuamos a produzir para outros em vez de criar para nós;
• Fica mais difícil fazer marcas portuguesas escalarem;
• O país investe na formação, mas o retorno vai todo para fora.
E isto, na prática, empobrece o futuro da moda em Portugal.
Não só financeiramente, mas culturalmente.
E o que podemos fazer? (sem entrar em discursos impossíveis)
A minha visão:
• Valorizar o designer como parte estratégica da empresa, não como um “decorador de peças”.
• Criar planos de carreira reais, com progressão e futuro.
• Dar orçamento para pesquisa, materiais, protótipos e tempo de criação.
• Fortalecer o “design made in Portugal”, não só o “produzido em Portugal”.
• E, principalmente, construir comunidade.
Designers precisam sentir que fazem parte de um ecossistema, não que estão isolados numa sala a desenhar para um mercado que não os vê.
Conclusão
Portugal tem escolas excelentes — EMP, UBI, Lusófona, ESAD, EML, LSD, Modatex — e forma designers muito acima da média.
Mas o mercado não acompanha a qualidade que estamos a formar.
E enquanto isso não mudar, vamos continuar a vê-los brilhar… só que noutros países.
Não escrevo isto como crítica, mas como convite para reflexão entre nós.
Se realmente queremos fortalecer a moda portuguesa, temos de começar exatamente onde tudo nasce: no design.


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